Evento no TRT8 discute políticas de inclusão e direitos humanos do público LGBTI+

Evento reuniu ativistas, juízes do trabalho e consultores de recursos humanos.
Empregabilidade LGBTI+

O evento pioneiro do TRT8 "Empregabilidade Trans: A inserção do Público LGBTI+ no Mercado de Trabalho" trouxe para a mesa de debates dois paraenses que atuam para criar perspectivas de trabalho para os LGBTs e são incansáveis no combate ao preconceito que evita a contratação dessas pessoas.
Convidada do primeiro dia do evento, a transexual paraense Bruna Lorrane, que integra a Comissão Inter federativa para Políticas LGBT do Ministério dos Direitos Humanos, foi uma das participantes do Painel "Políticas de Inclusão e Direitos Humanos". Apesar de todo o preconceito, Lorrane é um exemplo para o público trans. Graduada em Direito com pós graduação em Gestão Pública, nacionalmente ocupa posição de destaque na luta LGBT. É vice-presidente do Fórum nacional de Gestores LGBT (FONGES) e coordenadora do Centro de Referência em Direitos Humanos, da Prefeitura de Belém. Durante o painel, ela falou sobre "Protagonismo - Políticas Públicas para enfrentar o preconceito" e parabenizou a Justiça do Trabalho pela iniciativa. "É uma iniciativa que não vemos no Brasil e que seja um incentivo para que a gente possa proliferar cada vez mais esse tipo de iniciativa. Enquanto LGBT a gente só tem a agradecer e enquanto ativista a gente só tem a fortificar. Enquanto pessoa trans a gente percebe é que o que era tão óbvio enquanto necessidade nossa, que são fulcros da cidadania como o emprego, a saúde e a educação, para que a gente possa existtir em sociedade, é algo tão distante. É uma diferença abissal. O que a gente trouxe foi um apanhado do que a gente tem ainda engatinhando, ainda muito primário no cenário nacional. A gente trouxe os nossos anseios e um olhar diferenciado. A gente vai tentar fazer com que as pessoas olhem com o olhar dessa população pra que entendam que não são privilégios, mas necessidades fundamentais para que possam existir em sociedade".
Dividiu o debate com Bruna, o ativista Heitor Sebastian, homem trans e empreendedor social. Heitor ficou conhecido em Belém por idealizar um local que emprega pessoas historicamente às margens da educação e do trabalho. É o Espaço Art Ato que promove a inclusão social de pessoas trans por meio das artes. Sebastian considerou um marco a realização do evento."Eu achei um marco. A gente tem de inserir essa pauta nesse tipo de evento feito por instituições como o TRT. É uma necessidade que a gente tem. Enquanto minoria de direito as pessoas trans são jogadas a margem da sociedade. É preciso  conscientizar a sociedade para poder inserir essas pessoas. Eu falei sobre a empregabilidade trans, da necessidade de inserir essa galera na economia social e criativa e nas empresas".
O Painel foi intermediado pela juiza do Trabalho Marlise Maia, titular da 4ª vara do Trabalho de Marabá, que, em parceria com outras instituições, começou a desenvolver um projeto de fomento voltado para a empregabilidade trans no município do sudeste paraense. Em 2017, o Ministério Público do Estado (MPE), por meio da Promotoria de Direitos Humanos,  o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Justiça do Trabalho (TRT8) iniciaram a realização de audiências públicas com o público LGBTI, pois a principal reclamação desse público era a discriminação na fase pré-contratual. "Quando ele telefonava com uma voz e se apresentava de outra forma diziam que não queriam aquela pessoa na empresa. Esse projeto está na fase de coleta de dados, para saber o grau de escolaridade, quais as necessidades desse público em Marabá, porque vamos tentar ofertar cursos profissionalizantes com recursos do MPT, através de TACs e de condenações. Vamos também fazer um trabalho de conscientização principalmente com o Conjove e um trabalho de convencimento de que é bom para as empresas receber esse público no mercado de trabalho em Marabá e região".
Realizado por meio do Programa Trabalho Seguro e da Seção Socioambiental do TRT8, o evento dialoga com o tema "Violência no trabalho: enfrentamento e superação", do TST. Para a chefe da seção sócio ambiental da Justiça do Trabalho, Taíssa Bencke, foi uma oportunidade para debater um assunto muito atual e delicado. "Mais do que ter dado espaço para isso, é poder falar sobre essa questão da inserção que passa pelo diálogo. A gente criou um espaço de diálogo e um diálogo qualificado porque a gente teve a sociedade, advogados, representantes dos movimentos LGBTI, os próprios transexuais, servidores e magistrados. Acho que os frutos desse evento ainda não temos como calcular. Tem coisas que só vamos ver lá na frente."
A programação do evento também possibilitou conhecer as empresas que já estão atuando com uma política interna voltada para a  diversidade. O workshop "Como fazer uma política de diversidade para a sua empresa?" reuniu os especialistas Reinaldo Bulgarelli, do Fórum de Empresas e Direitos LGBT, e Jorgete Lemos, diretora de diversidade da ABRH Brasil. Na dinâmica, os participantes foram divididos em grupos e tiveram 15 minutos para apresentar as conclusões sobre o tema. Todos foram unânimes em dizer que a maior dificuldade de inserção dos LGBTI nas empresas ainda é o preconceito. "O preconceito que as pessoas não admitem que têm. A hora que todas as pessoas admitirem que têm preconceito e que isso tem fundamentação lá na sua infância,o fortalecimento da sua segunda infância e juventude, nos ambientes de convivência. A nossa sociedade é preconceituosa e as pessoas ficam deslocadas, como é que eu vou ser antagonista diante dessa posição que é da maioria. Então, as pessoas preferem se acomodar."
Sobre a empregabilidade dos LGBTI+ no Pará, Jorgete Lemos disse que as empresas ainda estão engatinhando na contratação desse público."Nacionalmente diria que ainda estamos engatinhando e aqui no Pará ainda estamos no útero". A representante da ABRH também  parabenizou o TRT8 pela realização do evento. "É o primeiro Fórum e está sendo apresentado por um Tribunal Regional do Trabalho. Não poderia ter um começo mais auspicioso do que este."
No auditório havia um público diverso como a transexual Jéssica Barbosa."Tema muito interessante. Confesso que estou feliz. É difícil sair vestida de mulher na rua, encarar a sociedade. É um tema delicado. O acesso ao emprego para a população trans é difícil, enfrentamos muito preconceito. Queria ter continuado meus estudos, mas acabei me defrontando com o preconceito, abandonei a escola, me prostitui", revelou a participante.
Magistrados presentes no evento destacaram que o evento foi um momento de muito conhecimento e aprendizado, como ressaltou a juíza Claudine Rodrigues. "Nós trabalhamos em uma instituição com muitas pessoas. Assim como na sociedade você tem várias pessoas diferentes de todos os gêneros e de todos os comportamentos. Acho muito importante para você saber lidar com essas pessoas dentro da sua organização e evitar que nós, inconscientemente,façamos uma seletividade com relação a gênero,orientação sexual, que não é mais aceitável no mundo moderno. E outra importância que eu acho também é na questão dos julgamentos, da análise dos processos. Nós lidamos com processos que muitas vezes são trazidos conflitos de relacionamento que trazem a  carga preconceituosa não só situações em que você tem problemas na contratação, preconceitos na fase pré-contratual, como durante o contrato de trabalho. Nós temos que conhecer a matéria. Não é possível fazer um julgamento justo sobre um conflito entre as partes se você não conhece o assunto. Esse conhecer,abrir os olhos para essa temática, e saber que é possível fazer um ambiente de trabalho inclusivo sem violar a intimidade de cada um. Nós sabemos que não podemos, por exemplo, aceitar que uma empresa, numa pré seleção ou num cadastro, exija a declaração de orientação sexual porque isso até tem jurisprudência que diz que é inconstitucional. Mas, esse debate, esse evento, ele é importante porque traz luz para o tema. Você traz esses elementos  que permitam que você diga: não, é sim possível você ter um ambiente de trabalho inclusivo, respeitoso e constitucional, dentro dos limites de respeito da individualidade de cada um".

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