27 de julho - Dia Internacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho
A triste constatação de que anualmente milhares de trabalhadores brasileiros são vítimas de acidentes do trabalho já nos sinaliza que nada há a ser comemorado neste dia, ainda teremos anos construindo uma cultura social, por meio de ações de diversos setores da sociedade.
Ao considerarmos que o trabalho é a força motriz produtiva não apenas de capital, mas também de formação de elevados valores da dignidade humana e de uma sociedade justa e saudável, impossível não tratar desse tema se não dedicarmos um olhar franco, analítico e muito doloroso sobre o papel de cada um na alimentação desse círculo vicioso.
O problema do acidente de trabalho, suas vítimas, seus impactos econômicos e sociais não estão além de nossos muros residenciais, escolares e empresariais, muito pelo contrário, cada vez que olhamos para esse tema temos que ele faz parte de cada um de nós, cada um que, com coragem, consiga olhar ao seu redor e identificar de que maneira, direta ou indiretamente, contribui para a ocorrência de acidente de trabalho.
Em nossas casas, será que em algum momento não estamos sendo omissos ou incrédulos de que uma conduta estaria negligenciando a saúde do meio ambiente pessoal ou familiar? Será que não estamos colocando em risco nossas vidas, dos familiares, dos trabalhadores e de toda uma sociedade?
Até que ponto um simples ato de compra e venda de um produto, sem o nosso olhar atento às questões de prevenção de acidentes, estaria contribuindo para a exploração de um trabalho degradante?
O que nos falta, ainda, para sermos agentes de efetivas práticas preventivas, quando ainda dedicamos mais atenção a uma tela de celular ao invés de fixarmos a atenção ao que acontece nas vias públicas e pedestres?
Diariamente centenas de ações, trabalhistas e ações civis públicas, são ajuizadas na Justiça do Trabalho brasileira, narrando tristes acidentes que matam e mutilam definitivamente ou temporariamente. Muitos se transformam em vergonhosos números estatísticos recordes de pensões por morte, de auxílio previdenciário etc. Somente no ano de 2022 foram 2.500 óbitos e 572.000 comunicações de acidentes de trabalho, ou seja, mais de 1.100 acidentes de trabalho por dia. Mas esses números, que ainda não representam a totalidade em face das subnotificações, impactam e utilizam bilhões de reais de recursos públicos, ainda conseguem ser pequenos se comparados a tudo que a sociedade brasileira e mundial gasta anualmente, direta e indiretamente. O que quero dizer é que um acidente de trabalho não é aceitável, por menor que ele seja, menos ainda é aceitar anualmente um exército de mutilados, de pensionistas, de mortos e descasos, cada acidente de trabalho reflete negativamente em nossa sociedade e em nossas vidas.
Quero neste momento chamar a atenção de cada um para a sua autorresponsabilidade, que deve ser compreendida, mesmo que não queiramos, como a quota individual de participação para a ocorrência de um acidente de trabalho. Se queremos uma sociedade mais justa, sadia e igualitária não há como fugir dessa condição de autorresponsabilidade. Vivemos em uma sociedade que a cada dia nos leva à precarização do trabalho, poucos são os que desfrutam a felicidade de ter a carteira de trabalho assinada, mesmo assim ganhando pouco. Muitos já desistiram desse sonho e se arriscam diuturnamente, lutando contra o tempo, por exemplo costurando vias públicas, em suas bicicletas e motocicletas, para entregar na porta de nossas casas o alimento que exigimos do comerciante chegar ainda quente. Outros aceitam trabalhar sem o uso de EPIs ou mesmo requisitá-lo por medo de perder a oferta de trabalho precário que lhe garantirá uma refeição naquele dia para si ou para a sua família. Alguns empresários na ganância de lucro ou diante de uma concorrência desleal tentam driblar a legislação protetiva da saúde do trabalhador.
Poucos sabem que o açaí, que invade as nossas mesas e abasta a nossa casa, também contém sua parcela de contribuição negativa, carrega em sua polpa acidente de trabalho como mortes e traumatismo, em sua maioria de crianças, à semelhança do que ocorre em outras diversas áreas como exploração mineral, agricultura, agropecuária, indústria, comércio, modais urbanos etc.
Por isso, o tema Prevenção de Acidentes e Meio-Ambiente do Trabalho na Amazônia prossegue perene na pauta da Justiça do Trabalho, com ciclo de palestras e seminários promovidos pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região por meio de seus gestores regionais do Programa Trabalho Seguro. Fazemos a nossa parte, procurando levar o conhecimento para magistrados, servidores, advogados, operadores do direito, estudantes do ensino fundamental, médio e superior, trabalhadores e empresários. Não temos grandes pretensões, estamos apenas semeando a cultura da prevenção de acidentes para quem tem sede de vida! E quanto a você?
Desembargador Walter Paro, coordenador regional do Programa de Trabalho Seguro