Círio 2018 - Campanha da Justiça do Trabalho contra o trabalho infantil é destaque nas romarias do Círio de Nazaré.
A tarde já findava quando foi dado início a mais uma procissão noturna do Círio de Nossa Senhora de Nazará, em Belém do Pará, e, durante toda a Trasladação, se destacou um pelotão formado por jovens,voluntários, magistrados, servidores e representantes de instituições parceiras que caminharam juntos pelas principais ruas do centro de Belém levando a mensagem de apoio à campanha de Combate ao Trabalho infantil, promovida pela Justiça do Trabalho da 8ª Região. Mais conhecida como Trasladação, essa romaria é uma das principais, por ser uma espécie de Círio noturno, quando milhares de pessoas caminham levado a imagem de Nossa Senhora de Nazaré até a Catedral de Belém.
Foi o momento em que jovens afilhados do projeto, alunos, parceiros, apoiadores, aproveitaram para divulgar a campanha e fazer juntos a súplica, explicou a juíza Vanilza Malcher, uma das coordenadoras da campanha. "É uma caminhada com todos os alunos de bairros e comunidades diversas num grande pelotão por todo o percurso da Trasladação, mostrando a todos que acompanham a romaria que existe um movimento social da Justiça do Trabalho em prol da criança e do adolescente de nossa cidade,de nosso estado e do nosso país, porque a campanha é uma campanha nacional."
A campanha levou para as ruas pessoas como o Luan Gomes. O jovem de 21 anos é padrinho cidadão do projeto do TRT8. Na infância, Luan foi trabalhador infantil e hoje atua como um voluntário do projeto conscientizando outros jovens no combate a esse tipo de atividade. "Eu tinha 13 anos quando vendi doces na rua, também trabalhei numa oficina,trabalhava para ajudar nas despesas da minha casa. Mais tarde, já longe das ruas, Luan chegou a trabalhar como jovem aprendiz numa empresa de Belém na função de auxiliar administrativo, onde posteriormente foi contratado. "Hoje sou padrinho cidadão e tenho mais de 15 afilhados no projeto. A mensagem que eu deixo para todos é que nós acreditemos sempre na educação pois ela faz a mudança no ser humano. A gente precisa educar nossas crianças, elas têm direito de sonhar e nós estamos aqui para dar esse sonho, para que elas possam ser os nossos melhores profissionais no futuro."
A mobilização reuniu também representantes de instituições parceiras. O Ministério Público do Estado, através das promotorias de infância e juventude e promoção de cidadania, também está engajado no combate ao trabalho infantil e procura levar cidadania para as crianças. Cândida Nascimento, procuradora de justiça do Ministério Público do Estado, integrava o pelotão e disse que o problema é cultural e precisa mudar. "Essa campanha tem o objetivo de mostrar para as pessoas que ainda estão com aquela ideia de que é melhor a criança estar trabalhando do que estar na rua, que somente 3% das crianças que são trabalhadoras infantis conseguem estudar e sair dessa situação de pobreza, de dificuldade. A maioria não sai. Vive permanentemente numa situação de pobreza e criminalidade. O maior desafio é conscientizar as famílias, porque tem muita família que acha que é mais interessante que o filho saia da escola e vá trabalhar, o que precisa mudar é essa cultura de que o trabalho infantil promove desenvolvimento da crianças, porque só faz perder a infância e colocar as crianças em uma situação de risco".
Representantes do Fórum estadual de Combate ao Trabalho infantil também estiveram na Trasladação para contribuir com o trabalho em prol da infância. Norma Miranda, presidente do Fórum, disse que há necessidade de fortalecer as políticas públicas nessa área. "A campanha veio agregar ao Círio um grande desafio nosso, que é o combate ao Trabalho infantil. A cada ano ela cresce, a cada ano as pessoas têm conhecimento sobre o que trata a campanha. É agregar um trabalho dentro de uma festa maior e dizer que todos têm o dever de lutar para o enfrentamento do trabalho infantil. É a religião, são os agentes públicos, a sociedade civil, todos juntos por uma causa só."
Desembargadores, juízes e servidores da Justiça do Trabalho se uniram ao pelotão para levar a mensagem para todos que participam do Círio de Nazaré. "Integrar esse grupo é solidário. O tema da campanha é sem igual. Fazer com que crianças e adolescentes passem pela sua fase dignamente é o mínimo que se pode fazer. A campanha já é um sucesso e nós esperamos que toda a comunidade abrace essa causa com a gente", disse a servidora Juciléa Rodrigues.
O desembargador Vicente Malheiros da Fonseca, decado do TRT8, lembrou que existem organismos internacionais de proteção à infância e que sente orgulho das juízas que encabeçam a luta em Belém, suas ex-alunas que hoje atuam no enfrentamento ao trabalho infantil no Pará. "É um grande orgulho a gente ter pessoas do quilate delas, que mais do que juízas são cidadãs e não estão só com os processos , estão na sociedade lutando. A maior satisfação do professor é ver o filho crescer, então é muita responsabilidade, mas quando olho para elas dá muita satisfação. Eu acho que o tribunal e esse movimento se engaja na sociedade com vários parceiros e está de parabéns. Somos o primeiro pelotão depois de sacristãos e padres. Isso é um grande prestígio e é muito importante."
Este foi o terceiro ano que o TRT8 levou para o Círio um pelotão especial para participar da Trasladação de Nossa Senhora de Nazaré. Para a desembargadora Zuíla Dutra, o objetivo é intensificar a conscientização da sociedade em um momento do Círio que tem grande participação da juventude, foco da campanha de combate ao trabalho infantil. "Este ano estamos com o protagonismo da infância e adolescência, pois nós entendemos que não é possível debater direitos humanos sem inserir nesse debate a criança e o adolescente, porque são as primeiras vítimas das mazelas sociais e são também os grandes multiplicadores de ideias. Então, a partir do momento em que eles absorverem essa ideia de que eles são capazes de promover mudanças na sua própria história, eles são capazes de ser protagonistas desse novo tempo que desejamos para todos nós, eu tenho certeza que vai começar a haver mudança em toda a sociedade. Então, esse é o pedido para a Virgem de Nazaré. Na sua juventude ela recebeu a notícia de que seria a mãe de Jesus e acolheu essa notícia com coragem, saindo ao encontro dos necessitados. Que a juventude receba esta mensagem pedindo a Virgem de Nazaré que interceda pelas crianças e adolescentes para que eles sejam agentes de transformação de sua própria realidade."
Foi a segunda participação dos voluntários na campanha encabeçada pela Justiça do Trabalho. A abertura da campanha de combate ao trabalho infantil promovida pelo TRT8 teve início na última sexta-feira, 12 de outubro, durante o Traslado da imagem peregrina para o município de Ananindeua.Por todo o percurso, estudantes de escolas públicas, grupos pertencentes a paróquias e voluntários de diversas comunidades localizadas na região metropolitana de Belém se mobilizaram em prol da infância e da juventude.
Em vários pontos do percurso da romaria, alunos e professores usando a camiseta da campanha se posicionaram em frente a escolas e instituições parceiras para divulgar a mensagem deste ano intitulada "Maria, jovem que vive em todos nós, inspira as crianças e os adolescentes a serem agentes de transformação de sua própria realidade!". Estampada nas camisetas da campanha, a frase e a imagem da personagem Maria, criada pela Assessoria de Comunicação do TRT8 para a série Direitos Animados,buscam traduzir o protagonismo de crianças e adolescentes para o problema do trabalho infantil que hoje atinge uma parcela significativa de jovens em todo o país e na Amazônia como um todo. "Essa imagem traduz o espírito da nossa luta. A proteção da infância vai propiciar uma adolescência sadia e um adulto feliz. Maria representa todos nós porque foi ela, na sua juventude, quem preparou o maior mestre da humanidade, que hoje é modelo para todos nós", disse a desembargadora Zuíla Dutra.
A Campanha da Justiça do Trabalho é realizada em parceria com a Arquidiocese de Belém e com a Diretoria da Festa de Nazaré. O arcebispo metropolitano de Belém, Dom Alberto Taveira, destacou as ações desenvolvidas como sendo uma maneira de evitar que crianças e adolescentes façam o caminho do trabalho infantil. "A cada ano essa campanha cresce mais, vai tomando corpo. É uma campanha em si mesmo positiva. O que me alegra é que a Justiça do Trabalho tomou a frente nessa dimensão preventiva e isso é muito importante. Nós não vamos simplesmente consertar onde existe o erro, mas queremos conscientizar as pessoas. Quem dera não tivéssemos nem um caso para julgar de trabalho infantil, é o nosso sonho. Sonho da Justiça do Trabalho, sonho da igreja, sonho do Círio de Nazaré."
O Padre Luiz Carlos, Reitor da Basílica Santuário, ficou contente em se deparar com a campanha nas ruas. "Fiquei feliz de ver ao longo da procissão essa manifestação, sobretudo esta presença. É algo muito importante para nossa sociedade combater o trabalho infantil. As crianças devem, nessa idade, estar na escola, estar brincando e vivendo a infância. Muitos de nós adultos não tivemos essa oportunidade, muitos de nós trabalhamos na nossa infância. E o trabalho infantil faz com que muitas crianças abandonem a escola e deixem de se desenvolver. Eu tive essa experiência. Eu consegui estudar porque desde criança eu me recusei a trabalhar na roça, na pesca, que era comum na minha comunidade. Isso obrigou os meus pais a se sacrificarem e me mandarem para estudar e isso fez com que eu continuasse os meus estudos e chegasse onde estou. Muitas pessoas que poderiam estar contribuindo de modo mais eficaz para o bem da sociedade e não pode. então, é muito importante conscientizar as pessoas."
As ações da campanha prosseguem nos dias 20 e 21 de outubro quando os voluntários participam de outras duas romarias do Círio de Nazaré. No dia 20 de outubro, às 16h, os voluntários participam da Romaria da Juventude, realizando uma homenagem à "Jovem Maria" em frente ao edifício sede do TRT8, na Praça Brasil. No dia 21, às 7h, na Praça Santuário, os voluntários participam da Romaria das Crianças com a distribuição de adesivos e dos cataventos que foram confeccionados durante a semana que antecedeu a campanha. O catavento é símbolo mundial da luta contra o trabalho infantil e traz em suas hélices alguns dos principais direitos das crianças e dos adolescentes como o direito a estudar, brincar, viver e sonhar.