A Justiça do Trabalho no extremo norte do Brasil
Com quase 30.000 habitantes e distante mais de 600 km da cidade de Macapá, capital do estado do Amapá, o município de Oiapoque surpreende pela constante e intensa movimentação em suas ruas, mostrando um pujante comércio que se movimenta bastante com o vai e vem das rabetas que transportam diariamente a população daquela região, acostumada a passar de um país a outro com um breve navegar no rio da baía que tem o nome da cidade, que divide o Brasil da Guiana Francesa e corre em direção ao oceano Atlântico.
Posicionado como o terceiro maior município entre os dezesseis que formam o estado do Amapá, o Oiapoque fica atrás somente da capital Macapá e da cidade de Santana, que abriga o porto por onde é escoada grande parte das riquezas produzidas naquele estado que forma a Região Norte brasileira e que, junto com o estado do Pará, integra a área de jurisdição da Justiça do Trabalho da 8ª Região, que possui 8 varas localizadas no Fórum Trabalhista de Macapá, responsável pelo atendimento das demandas trabalhistas de todo o estado, além de municípios que integram o arquipélago do Marajó (Afuá e Chaves), no Pará.
Em razão do isolamento, o deslocamento dos moradores do Oiapoque para outras cidades pode durar muitas horas, dependendo da situação em que se encontra a BR-156, única estrada que faz ligação com a capital. No primeiro semestre do ano, em razão das fortes chuvas na região, o trecho que 100 km da rodovia que ainda insistem em estar sem asfalto é responsável por cenas que não deixam a dever aos mais destacados rallyes, sendo comum a necessidade de apoio de tratores para tirar os veículos de imensos atoleiros, mesmo os que possuem tração nas quatro rodas. Com isso, a hora de saída pode ser certa, mas a hora de chegada depende da quantidade de água caída com as chuvas e acumulada. No segundo semestre o quadro é melhor, com a estrada ficando "perigosamente boa", como dizem os que estão acostumados a trilhar esse pedaço distante da fronteira brasileira, já que, com o sol, a terra fica muito seca, formando nuvens de poeira que causam uma nuvem que some com a estrada, o que dobra a necessidade de destreza e atenção do piloto, que, sem experiência, pode sofrer um sério acidente.
Foi dentro desse contexto que a equipe da 1ª Vara do Trabalho de Macapá, tendo à frente a sua juíza titular, Natasha Schneider, realizou a itinerância naquele município no período de 27 a 29 de agosto. Em parceria com a Universidade Federal do Amapá, por meio do seu Campus Binacional e a coordenação do curso de Direito, a Justiça do Trabalho, com o apoio de alunos e professores do curso de Direito, iniciou em junho o processo de levantamento das reclamações no Oiapoque, que foram listadas nas pautas de audiência realizadas na última semana de agosto. A fim de obter maior aproveitamento da visita da JT naquele município, a parceria com a UNIFAP contemplou a realização do I Congresso Internacional de Direito do Trabalho no Extremo Norte, realizado de 29 a 31 de agosto, nas dependências do Tribunal do Júri do Fórum Cível de Oiapoque, contando com a presença da magistrada trabalhista e dos desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho, Vicente Malheiros da Fonseca, decano do TRT8, e Sulamir Palmeira Monassa de Almeida, vice-presidente da corte, no exercício da Presidência no decorrer de todo o evento.
Coordenadora da itinerância, a juíza Natasha Schneider relatou que a ideia de realizar a ação já estava já estava formatada e com a aprovação da Corregedoria Regional, mas sabia que a complexidade de sua execução seria grande, em razão das condições da estrada, dos custos com a atividade e a mobilização local, mas a presença do Estado em uma região de fronteira como o Oiapoque, em que a Justiça do Trabalho não possui uma vara, foi de grande relevância. "E vi muito otimismo, foi a primeira experiência, e foi de grande valia a parceria com a UNINFAP nessa tomada de reclamação. Acredito que todos aproveitaram que a Justiça do Trabalho se fez presente também para realizar esse evento jurídico, especialmente os alunos, que não tinham a oportunidade de ter a experiência prática e acompanhar o desenvolvimento de um processo trabalhista.”, destacou a magistrada.
A professora Cindi Almeida Teles, integrante do corpo docente da UNIFAP, afirma que "o projeto é muito importante, pois, trata-se de um local de difícil acesso, e é importante ressaltar, que neste primeiro momento foi de instrução dos seus direitos para os alunos. Os resultados que foram alcançados farão com que possa acontecer mais vezes a necessidade de realizar o projeto, e é a primeira vez que a Justiça do Trabalho vai tão longe; além disso, a procura da população ainda foi muito tímida, por conta da falta de conhecimento de muitos, um dos fatores que interferiam de certa forma na apresentação das reclamações."
Para alguns alunos da UNIFAP a experiencia foi extremamente relevante, a aluna de Direito Laucicélia Moraes relata que “a Itinerância chegar até ao extremo norte é uma ação positiva, alguns trabalhadores sentiram uma dificuldade enorme para vir até Macapá enfrentando às vezes mais de 12h de viagem pela estrada, só para encontrar a Justiça do Trabalho para garantir seus direitos. E para minha vida acadêmica eu gostei demais por poder ter a oportunidade de trabalhar com a Justiça do Trabalho, de receber as reclamações e acompanhar as audiências, onde tivemos muitos resultados positivos”.
A aluna Jordana Pereira relata que “a população do município de Oiapoque viveu um momento bastante especial com a Justiça Itinerante chegando até a cidade, uma vez que a sociedade não tem essa oportunidade de pleitear esse direito. Permitir aos cidadãos os seus direitos é fundamental, e o Estado tem que mostrar meios de acesso satisfatório para a população. Reforço que o medo dos trabalhadores foi um fator que interferiu nessa Itinerância que dificultou alguns processos. E para minha vida acadêmica foi uma grade experiencia, gostei de fazer os atendimentos, fiquei bastante comovida, a sociedade ficou interessada pela grande procura, por isso creio que a Justiça do Trabalho poderia pensar em parceria com o Tribunal de justiça e Ministério Público para montar uma estrutura e realizar esses atendimentos frequentemente, tendo em vista a necessidade da população da cidade.”
Coordenadora do curso de Direito Civil e Empresarial da UNIFAP, a professora Priscila Almeida integrou a Comissão Organizadora das ações da parceria no Oiapoque, e destacou que "o município é novo, um lugar cheio de diversidades culturais, uma cidade que mescla tudo. É estimulante, é satisfatório ver a população e os nossos alunos vendo pela primeira vez uma prática trabalhista. Persistindo é que conseguimos, foi uma experiencia incrível, a melhor parte foi dizer aos alunos que nossa solicitação foi aprovada e que estaríamos vivendo algo novo, como Coordenadora do Curso acredito que foi relevante e na próxima será muito melhor.”
De acordo com o diretor da 1ª VT de Macapá, Rodrigo Oliveira, "das 23 ações ajuizadas, 11 ações foram com a data da demissão dos reclamantes em 2018, 05 com demissões em 2017, sendo que 04 com mais de um ano da data da demissão, 05 com demissão em 2016, sendo duas ações prescritas, porém em uma ação ( 0000626-03.2018.5.08.5.0208) foi conciliado, 01 uma ação com data de demissão em 2014 e outra em 2010. Há uma demanda reprimida no município de Oiapoque devido a distância entre aquela localidade e Macapá, além do alto custo com o deslocamento uma vez que a passagem do ônibus custa R$ 115,00 por trecho. Inclusive uma reclamada, em razão do alto custo para se chegar ao Oiapoque, optou por reconhecer o pedido do reclamante e efetuou o pagamento do pedido integral quitando a ação."
A itinerância foi concluída com excelentes resultados. Confira:
- Ações Ajuizadas: 23
- Acordos: 13
- Desistência: 01
- Arquivamentos por falta a inaugural: 02
- Adiadas: 02
- Revelia: 01
- Conclusos para sentença: 03
- Sentenciadas em audiência: 02, sendo que em um processo a reclamada reconheceu o pedido do reclamante e depositou antecipadamente o valor do pedido.
- Total de créditos de reclamantes conciliados: R$ 140.200,00
- INSS: R$ 8.516,15
- Créditos recebidos em audiência: R$ 27.319,86
Veja fotos no Flickr do TRT8.