Roda de conversa traz os desafios da mulher no transcurso da pandemia da Covid-19
Diversas indagações e reflexões foram pontuadas na roda de conversa promovida pela Escola Judicial do TRT8 na tarde de ontem (9), encerrando a programação de abertura do ano letivo. Hoje estamos frente a um novo desafio, desafio da guerra, desafio do novo século, de manter a dignidade humana em todos esses aspectos. A pandemia escancarou não apenas a diferença entre homens e mulheres. Como as pessoas se relacionam entre si tanto na esfera pública e privada? A pandemia nos faz refletir ainda mais sobre o significado da frase: Homens e mulheres são iguais? Qual foi o impacto da pandemia na saúde física e mental das mulheres? E nós conseguimos apoiar umas as outras?. Todas essas questões foram levantadas pela juíza do Trabalho, Léa Sarmento, no papel de mediadora da roda "O sistema de Justiça para as mulheres do judiciário. Dois anos de pandemia. O que mudou?".
Para este momento, o TRT8 convidou mulheres para compartilhar e descrever sua experiência, observando sempre o diálogo, debate, e perceber que nós não estamos sozinhas, compartilhamos as mesmas angústias, declara a magistrada Léa Sarmento, que também preside o Comitê de Incentivo à Participação Feminina na Justiça do Trabalho da 8ª Região.
A juíza de Direito, Josineide Pamplona Medeiros, do Tribunal de Justiça do Pará foi a primeira convidada que contou histórias do seu dia a dia como juíza da Vara da Família. "Fiquei muito feliz com este convite que me dá a possibilidade de contação de história, do que vivenciamos durante a pandemia, de algo tão rico e técnico. A pandemia igualou todo mundo. Aquela máxima que a casa é o espaço do feminino, do trabalho, do afeto, do masculino, veio abaixo. Todos compartilhavam o mesmo espaço. A casa se tornou o espaço de protagonismo de todos, de homens e mulheres, seja no ambiente escolar, seja no ambiente de trabalho. E nós não conseguimos estar bem neste espaço, movimentar esse cenário", relata.
A magistrada comentou sobre o roteiro de um filme de animação chamado "A ganha pão" que retrata a história de uma menina que vive no Afeganistão, governado pelas forças do Talibã. Quando seu pai é preso de maneira injusta, ela precisa se disfarçar como um menino para trabalhar e garantir o sustento de sua família. Este filme retrata a experiência de uma menina afegã no cenário do extremismo.
Ela deixou uma mensagem para todos os presentes. "Levante as suas palavras e não a sua voz, porque as flores brotam da água das chuvas e não do ronco dos trovões. Para sermos e estarmos no mundo não precisamos perder a nossa sensibilidade, perder nossos aspectos emocionais, como quem fere, violentamente, só precisamos contar as nossas histórias, e através delas encontrar ressonâncias, empoderamentos recíprocos. Todos nós, homens e mulheres, adultos e crianças ainda estamos nos educando dentro de um cenário que tem um calabouço arcaico", finalizou a magistrada.
Letramento em Gênero – A coordenadora da Comissão da Mulher Advogada da OAB/PA, Natasha Vasconcelos, enriqueceu o debate com reflexões sobre questões de gênero e afirmou que a Ordem dos Advogados do Brasil no Pará vem realizando uma campanha sistemática no combate a questão de gênero, não só para o Judiciário mas também para advocacia. "A provocação que a gente tem feito é uma advocacia feminista. Voz a gente tem, o que a gente precisa é promover os espaços para que essas vozes sejam ouvidas com políticas de gênero dentro da advocacia. 50 advogadas foram capacitadas ao longo desses três anos dentro do Letramento de Gênero", comemora.
Natasha Vasconcelos apresentou reflexões sobre a sobrecarga mental e humana da mulher; conceito de dignidade menstrual e exemplificou a violência psicológica se caracterize como crime. "Nós queremos ser reconhecidas pelas nossas diferenças e que gerem assimetrias dentro do espaço público e privado. Eu gosto muito de uma frase da Maria da Penha: A vida começa quando a violência acaba".
A juíza do Trabalho da 6ª Vara de Macapá, Odaíse Cristina Martins, fez um relato emocionante sobre os desafios que a pandemia da Covid-19 impôs na vida profissional e familiar. "Nesta pandemia todos nós enfrentamos a questão do medo, da angústia de perder entes queridos. Eu perdi familiares e a gente ficava só, isolado com todas essas angústias. Inicialmente o teletrabalho também foi muito difícil para mim em relação à falta de estrutura e conexão com a internet. Mas logo depois, consegui adaptações e advocacia, as partes se adaptaram. E acredito que veio para ficar o teletrabalho, e está sendo muito importante dentro de um recorte de gêneros".
A magistrada também enfrentou momentos difíceis com a internação do marido que teve covid. "Todo esse turbilhão com essa crise sanitária em todo mundo, aqui no meu Estado do Amapá houve uma crise energética, um apagão e eu fui convidada pela Comissão de Combate ao Trabalho Infantil do Tribunal a aderir a campanha 'Somos todos Amapá'. E consegui ajudar a população do meu Estado, senti a necessidade de ajudar meus irmãos amapaenses, que até água mineral faltava para todos", detalha a juíza do Trabalho de Macapá, que recebeu palavras de apoio e solidariedade pelo relato emocionante durante a roda de conversa.
A servidora do TRT8, Marcela Braga Coelho e a psicóloga, Úrsula Custódio foram as últimas a darem sua contribuição pessoal e reflexiva no diálogo. Marcela Coelho está em teletrabalho na capital federal. "Meu marido é militar e em março de 2020 comecei o teletrabalho. A experiência de estar em teletrabalho veio também para mostrar a falta de limite que é o trabalho e a nossa vida privada. Essa carga que a gente carrega, cuidar dos filhos, da casa, essa instabilidade mexe muito com nosso emocional. De fato a pandemia escancara essa carga dentro da nossa casa. Nossa rotina, nossa vivência não seja tão pesada para que a gente veja a vida mais leve. Meus gestores do Tribunal sempre foram gestores muito sensíveis à nossa realidade de servidor".
Úrsula Gomes, psicóloga e servidora do TRT8 fez um alerta importante para todos os participantes. "Quais foram os impactos em razão das mulheres na pandemia? Nós muitas vezes não ficamos atentas ao que acontece com o nosso corpo. Essa pandemia trouxe essa aceleração, a gente tinha que ficar em estado de alerta o tempo todo. Trouxe o adoecimento psíquico, ansiedade, adoecimento do sono, problemas de saúde. É importante pensar de como fica a Mulher no lugar de cuidadora do outro, se cuidar?", finaliza.
O evento foi elogiado pelos participantes, magistrados, magistradas e servidores. Para a juíza do Trabalho da 1ª Vara de Parauapebas, Roberta de Oliveira Santos, o termo "guerreira" evidencia o quanto nós, mulheres, vivemos em violência... entendendo violência não apenas a física, mas tudo o que dificulta a leveza da nossa vida... culpa, cobrança, imposições... até quando, realmente?"
A juíza titular da Vara do Trabalho de Óbidos, Meise Oliveira dos Anjos, parabenizou a roda de conversa. "Excelente roda de conversa. Reflexões importantes e necessárias. São rodas de conversa que nos inspiram, nos revigoram, nós temos que lutar pelas questões de gêneros", finaliza.
O evento foi uma realização do TRT8, da EJUD8, do Comitê de Incentivo à Participação Feminina no Judiciário e com o apoio da Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão da Justiça do Trabalho no TRT8.
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