TRT-8 lança campanha de sensibilização sobre refugiados e migrantes
“Na hora da fuga, levei só o mais importante” é a frase-chave da campanha criada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará e Amapá) para conectar o público à condição de refugiados e migrantes. Na maioria das vezes, sem saber a língua local, sem ter todos os documentos em mãos e sem nenhum recurso, encontrar acolhimento no local de destino é fundamental para a sobrevivência dessa população.
E isso foi o que motivou a criação da campanha como parte do projeto “Os desafios dos migrantes no mercado de trabalho na Amazônia Oriental”, do Comitê Regional do Programa Nacional de Enfrentamento ao Trabalho Escravo e ao Tráfico de Pessoas e de Proteção ao Trabalho do Migrante do TRT-8, com recursos do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
A campanha foi lançada na última quarta-feira, 13, começando pelas redes sociais do TRT-8, com vídeo e arte gráfica. Mais adiante também serão distribuídos cartazes com a colaboração das entidades parceiras. Essa busca por sensibilização para o tema é fruto de tudo o que foi apresentado ao longo dos workshops do projeto.
“Nós fizemos um primeiro workshop [em 20 de setembro], no qual ouvimos migrantes, representantes das associações dos haitianos, dos estudantes universitários migrantes, dos indígenas warao, da associação dos venezuelanos não indígenas, da Cáritas Belém, OAB… E nós percebemos que as pessoas estavam muito preocupadas com a questão do do trabalho formal”, relata a desembargadora Suzy Koury, coordenadora do Comitê.
Foram ouvidos relatos como de Norberto Warao, formado em Administração, mas que não conseguiu ainda revalidar seu diploma no Brasil e chegou sem saber falar português. “Passei três meses trabalhando em uma loja de roupas, das 8h às 22h, ganhando R$ 5 por dia. Ninguém me disse que não era correto. Eu só sabia que precisava de qualquer dinheiro. E eles (patrões) diziam que não era pra eu falar com outras pessoas, para eu ter cuidado, porque podiam me sequestrar no Brasil, para eu não falar com brasileiros”.
Ele contou que em outra empresa foi obrigado a mudar o seu estado de refugiado para migrante para eles aceitarem contratá-lo, o que o fez perder uma série de direitos que tinha e não sabia. “Eu não saí do meu país em busca de emprego ou condições melhores. Eu saí por medo, por ameaças, eu fugi. (...) Eu tenho mais de 15 certificados de cursos que fiz desde que cheguei no Brasil, em 2015, sem conseguir trabalho formal. Tem dia que fico triste, tem dia que fico com muita raiva”, disse ele.
Observar este anseio, fez com que o Comitê do TRT-8 decidisse por foco sobre o assunto. Na sequência, então, foi ministrado o curso sobre “Inclusão Socioprodutiva de Refugiados e Migrantes Venezuelanos da Grande Belém”. De acordo com o desembargador Sérgio Rocha, coordenador do Comitê, o curso foi voltado para a informação e conscientização de Direitos dos Trabalhadores Migrantes e contou com as entidades parceiras em sua divulgação. “Nós estamos em constante diálogo com elas para assegurar que a maior quantidade de trabalhadores possível esteja informada dos seus direitos”.
Depois do curso, foi a vez de tentar dialogar com representantes da Federação das Indústrias (Fiepa), de associações de lojistas, do Sebrae e do Sesc. “Essas pessoas puderam ouvir o nosso projeto, conhecer o que é possível fazer, ver se pode contratar um migrante, o que muitas vezes eles não sabem. Então nós vamos trabalhar nessa rede mostrando como pode ser contratado, mostramos que qualquer tipo de documento que aquele migrante tenha é possível a contratação. E fortalecemos essa grande rede formada com as pessoas do primeiro workshop”, comentou a Dra. Suzy Koury.
A campanha de sensibilização é uma aliada para esse primeiro contato, para que o diálogo seja iniciado entendendo-se a condição de vulnerabilidade em que essa população se encontra ao chegar no Brasil. “Ainda falta um centro de referência estadual para atender aos migrantes e refugiados em Belém. Faltam intérpretes em órgãos de acesso aos direitos humanos”, como aponta Jose Lopéz, venezuelano mediador cultural na Funpapa Belém.
Samuel Medeiros, presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB, acrescenta que houve avanços no aspecto legislativo, mas que, de fato, há questões trabalhistas que ainda são um grande entrave. “O documento de trabalho deveria ser o primeiro liberado para os migrantes e refugiados, mas não é a realidade. Então você tem médico, professor, vendendo água no sinal porque não consegue adentrar o mercado formal. Tem engenheiro se tornando ambulante. Nós mesmos estamos perdendo mão de obra qualificada”, aponta.
Por isso, uma próxima ação do Comitê, em paralelo com a campanha lançada esta semana, será promover mais encontros com representantes deste mercado formal de trabalho na região. “O próprio Sebrae, Sesc, vão ampliar essa nossa rede e, dentro disso, nós vamos começar a trabalhar essa empregabilidade de um modo mais concentrado. E teve uma ideia muito boa, da representante do Sesc [Mirna Oliveira], de criarmos um selo de ‘Empresa Amiga do Migrante e do Refugiado’, para sinalizar a contratação dessas pessoas”, acrescenta a Dra. Suzy.
“A gente vai dar esses novos passos, muito provavelmente, a partir do início do ano que vem. Agora, nós seguimos com vídeos, spots e os cartazes da campanha de sensibilização, que vão ser distribuídos agora também com a ajuda desses parceiros. De um modo geral, eles não visam apenas a fazer com que os empresários não tenham medo de contratar, mas que toda a comunidade acolha essas pessoas que vieram fugidas para cá, é uma característica que o Brasil tem há muito tempo, acolher bem os refugiados e migrantes que vêm para cá”, finaliza a Dra. Suzy.
Acompanhe o vídeo da campanha no Canal do YouTube do TRT-8.